História

A ideia para a criação da Associação surge a partir do interesse manifesto pelos usuários da saúde mental em relação ao trabalho. Desde o início da década de 1990, com o processo de implantação das redes substitutivas aos manicômios em Belo Horizonte, essa nova perspectiva de tratamento em liberdade passa a ganhar voz, assim como a demanda dos usuários que frequentavam a Rede de Saúde Mental.

O Fórum Mineiro de Saúde Mental vai acolher as demandas de trabalho dos frequentadores da Rede e propõe um projeto de qualificação profissional junto ao poder público municipal para a inclusão produtiva dos usuários da rede de saúde mental. O município adere à ideia e leva a proposta para os outros entes - estadual e federal - os quais apoiam a causa e disponibilizam recursos para a capacitação dessas pessoas nas áreas eleitas pelos próprios usuários interessados.

Assim, em 1999, com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) do Ministério do Trabalho e Emprego, o Fórum Mineiro de Saúde Mental organizou e fez acontecer a formação conceitual e técnica dos usuários. Foram selecionadas em uma primeira rodada cerca de 110 pessoas que ingressaram nas turmas, contando com parcerias da rede pública e de Organizações Sociais para a estruturação e realização dos cursos. Foi o primeiro passo rumo à autonomia desses indivíduos e à reafirmação de sua liberdade de escolha, constituindo uma iniciativa inovadora à época e considerada exitosa quando comparada a outros projetos de capacitação. Em 2000, repetiu-se a experiência, ampliando sua abrangência e incluindo novas pessoas e modalidades de cursos.

No entanto, esse movimento de capacitação - embora bem sucedido - gerou um desafio futuro. Onde essas pessoas, agora instruídas e disponíveis para a produção, iriam trabalhar? Essa angústia se instaurou e em 2002 foi realizado o seminário "A conquista do trabalho: um Projeto Antimanicomial", organizado pelo Fórum Mineiro de Saúde Mental, que trouxe para a reflexão esse projeto de inserção. Usuários, trabalhadores, ativistas e colaboradores se reuniram para pensar uma saída. É nesse momento de intensas discussões e construção conjunta que a ideia da Suricato ganha forma em Belo Horizonte, sendo estabelecida em 26 de maio de 2004 com a Assembleia para a aprovação do estatuto da Associação de Trabalho e Produção Solidária - Suricato, e a eleição da 1ª Coordenação Colegiada, neste ato constitutivo.

Surge uma organização gerida de forma horizontal, regida pelos princípios democráticos da economia solidária e do resgate do sentido do trabalho na vida humana, com respeito ao ritmo e à singularidade de cada um. Cada associado vem aprendendo a gerir com a prática, construindo lideranças, conferindo projeto e captando recursos em uma trajetória desafiadora e contínua. No início, os associados trabalhavam com o reaproveitamento de materiais descartados - aparas de jeans, materiais recicláveis em caçamba, dentre outros - transformando esses resíduos em produtos comercializáveis. As peças eram vendidas em feiras, contando com a proatividade dos seus colaboradores e de apoiadores da causa.

Reconhecendo a importância dessa experiência e a sua relação com a política pública da Saúde Mental, a Secretaria Municipal de Saúde cria, em 2005, a política pública de inclusão produtiva para usuários da rede de saúde mental em BH: a Incubadora de Empreendimentos Econômicos Solidários, como estrutura de apoio a essa iniciativa.

Esse suporte foi importante para consolidar parcerias e conferir perenidade e sustentabilidade à Associação. Frente a todo esse contexto, por uma feliz escolha, a Suricato deu mais um passo e abriu uma porta na cidade. No ano de 2011 iniciou-se um processo de criação da logomarca da instituição. Em uma oficina que contou com a participação de produtores de todos os núcleos, com o apoio de uma escola de Design e a partir dos materiais utilizados nas oficinas e ateliês, foi criada a nova marca da Suricato lançada em dezembro de 2011 numa casa no bairro Serra em BH, experiência que possibilitou a expansão do olhar e a percepção de sua potência para a abertura do atual Espaço Cultural Suricato, dois anos e meio depois.

A estada nesse espaço da Serra foi marcada pelos preparativos, que contaram com a produção e exposição de peças, convites casuais a artistas para se apresentarem ao longo da semana de lançamento da nova marca e uma aderência cada vez maior do público. Esse movimento de reunião cultural foi ganhando forma e frequência, consolidando um experimento pelo qual os empreendedores tomaram gosto.

Pela primeira vez, nas palavras dos associados, "A cidade nos abraçou e nós abraçamos a cidade." A partir de então, não tinha como voltar atrás. Em 2014, finalmente, a Suricato encontrou um lugar no bairro Floresta em BH. Nesse espaço, as pessoas se unem para fazer frente à exclusão e à violação dos direitos. Essa experiência de aproximação desnuda várias situações dentro de cada um de nós, trazendo indagações como: de perto, o que é a loucura? As pessoas relativizam o medo dessa condição humana que pode ocorrer em qualquer momento na vida de qualquer um, percebendo que não é o fim e que existem saídas, possibilidades de vida.

Por que Suricato?

No processo de construção do estatuto da Associação, buscava-se um nome que remetesse à essência da luta, mas sem explicitar o termo "saúde mental". O nome foi pauta de muita discussão, até que um dos trabalhadores sugeriu o nome "Suricato".

Os Suricatos são animais que vivem em galerias na África, sendo presas fáceis caso não se organizem, não dividam as tarefas e não cuidem uns dos outros. Era a analogia perfeita para as pessoas em sofrimento mental frente ao mercado de trabalho tradicional. Sozinhos eles encontram muitas barreiras e preconceitos. Mas juntos e organizados se fortalecem, empreendem e conquistam um lugar para produzir, uma identidade e um lugar para o cabimento da loucura no mundo.